A Doença como autopunição.
09/04/2020
Autora: Caroline Gouvêa S. Wallner
De acordo com as concepções psicanalíticas freudianas, a doença pode aparecer como um meio de autopunição com o objetivo de aliviar a culpa. A culpa, porém é um sentimento muito difícil de ser reconhecido por algumas pessoas, outras a reconhecem em demasia e não se movimentam. As pessoas falam em desconforto ou infelicidade, mas não conseguem enxergar em si próprios tal sentimento. Culpa ou responsabilidade?
A culpa também é um dos nossos freios. Um perfil extremamente narcisista não reconhece a culpa. Os perversos não reconhecem a culpa. Ela é introjetada no sujeito desde a infância, pelo temor a autoridade externa, e está presente na cultura de todos os tempos. Seu registro encontra-se no superego. A doença aparece quando estes conteúdos superegoicos se tornam rígidos e cobram de forma desmedida o sujeito .
Além disso, a “ doença” também pode trazer ganhos, que nomeamos de secundários, como a proteção. “ Se eu me livrar deste comportamento , ou não tiver mais isso, o que sobrará?”( um dos discursos que remete à culpa e a cobrança pelo superego rígido ).
“A doença pode ser usada como uma proteção – para desculpar a incapacidade para o trabalho, ou entre competidores ou na vida familiar, como um meio para forçar sacrifícios e demonstrações de afeto de parte dos outros ou para impor a própria vontade sobre eles”. Mas entenda, não é porque ela quer, como algo proposital e consciente. Essa força é mais forte do que ela. A pessoa não consegue sair deste movimento sozinha.
Desta forma, podemos assumir que a doença tem início no plano inconsciente, ela é gerada como punição e é a expressão de um desejo do sujeito por afeto ou por uma necessidade, assim como é uma proteção que evita que o sujeito se exponha a situações indesejáveis como, por exemplo, o trabalho e a competitividade.
É certo que a grande maioria das pessoas rejeita esta ideia e não compreende conscientemente como pode haver algum “ganho “ em adoecer, assim o doente jamais percebe a conexão entre doença e comportamento. Entretanto este também é um processo mental inconsciente. Cabe ao consciente ( como mecanismo de defesa do ego) negar, duvidar e ao inconsciente buscar a realização de seus desejos, a qualquer custo. Até porque o conteúdo inconsciente não tem a noção de moral, tempo cronológico, regras… etc. É regido sob o princípio do prazer. Mas aí vem outro princípio, o da realidade, e promove uma contradição.
Mecanismo de defesa é uma denominação dada por Freud para as manifestações do Ego( tem raízes no inconsciente) diante das exigências das outras instâncias psíquicas (Id e Superego e meio externo). Mecanismos de defesa do Ego: projeção, formação reativa, racionalização, negação, isolamento, deslocamento, regressão, sublimação e recalque (repressão).
Os mecanismos de defesa do Ego são processos inconscientes desenvolvidos pela personalidade, os quais possibilitam a mente desenvolver uma solução para conflitos, ansiedades, hostilidades, impulsos agressivos, ressentimentos e frustrações não solucionados ao nível da consciência.
Posteriormente Freud ampliou o conceito de mecanismo de defesa, aplicando-o tanto a situações normais quanto patológicas (nas quais um método especial de defesa protege o ego contra exigências instintivas). A indicação para a patologia é via de regra, pelo excesso e prejuízo.
Temos também os mecanismos maduros de defesa, se assim podemos dizer: RENÚNCIA ALTRUÍSTICA- arrolada por Gabbard (2005); SUBLIMAÇÃO, de acordo com Fenichel (2000), é o mais eficaz dos mecanismos de defesa, na medida em que canaliza os impulsos libidinais agressivos para uma postura socialmente útil e aceitável; HUMOR, Freud discute pela primeira vez a respeito das formas de comicidade em 1905, na obra Os chistes e sua relação com o inconsciente; SIMBOLIZAÇÃO, um deslocamento com ressignifição daquilo que outrora provocava sofrimento.
A existência do inconsciente pode ser comprovada pelo fenômeno da memória (só temos consciência momentânea de parte muito pequena de nossas lembranças), pelo hábito (agimos sem termos consciência disso, repetimos comportamentos e ações sem saber o por quê ), nos sonhos, onde nossos desejos reprimidos exprimem-se espontaneamente, e no discurso expresso através da linguagem ou do corpo encenado. O inconsciente também pode se manifestar através de sintomas. E estes sintomas são particulares para cada pessoa, pois cada uma tem uma história de vida. Nós adultos somos conduzidos pelos restos e rastros dos registros do inconsciente . Freud já dizia “nada é meramente psíquico ou meramente somático…”
Bibliografia:
FREUD, Anna. O ego e os mecanismos de defesa. Porto Alegre Artmed, 2006.
FENICHEL, O. Teoria Psicanalítica das Neuroses. Atheneu. 2000.
GABBARD, Glen O. Psicoterapia Psicodinâmica de Longo Prazo: texto básico. Porto Alegre: Artmed, 2005.
________________________________________
Sobre a Autora: Caroline Gouvêa S. Wallner* CRP04/25492– Psicóloga (2006); Especialista em Saúde Mental e Atenção Psicossocial; Psicanálise. Editora e responsável pelo o Psicanálise e Amor Atendimento clínico há 16 anos. Contato: (15) 98119-7327 carolinegouveapsi@gmail.com